terça-feira, julho 31, 2012

A cultura moderna nasceu em África há 44 mil anos?

A nossa visão das origens da modernidade intelectual e tecnológica humana tem ultimamente sido abalada por várias descobertas. Primeiro, foi a confirmação de que algumas das pinturas feitas pelo Homo sapiens na Gruta Chauvet, em França, tinham 30 mil anos - isto é, eram muito mais antigas do que toda a arte pré-histórica conhecida. Depois - e ainda mais inesperada - veio a notícia de que pinturas encontradas em várias grutas de Espanha, algumas delas com 40 mil anos, terão sido feitas por neandertais. Enquanto a primeira descoberta fazia recuar em 10 a 15 mil anos a emergência da modernidade cultural da nossa espécie, a segunda retirava-nos pioneirismo em matéria cultural.
Agora, uma série de novos resultados, revelados hoje em dois artigos na revista Proceedings of the National Academy of Sciences, poderão mesmo pôr em causa o facto de a modernidade humana ter nascido exclusivamente na Europa. Uma equipa internacional de cientistas descobriu que, há 44 mil anos, um dos povos da África do Sul, os San - que ainda hoje lá vivem, sendo também conhecidos como bosquímanos (termo que no entanto é considerado pejorativo) -, já dava todos os sinais culturais e tecnológicos de modernidade.
Até aqui, o consenso era que, em África, as sociedades modernas de caçadores-recolectores só teriam surgido há 10 mil a 20 mil anos. Mas Francesco d"Errico, da Universidade de Bordéus, França, e colegas tornaram a datar os objectos encontrados numa gruta habitada pela cultura San - a gruta de Border, nos montes Libombos, na fronteira entre a África do Sul e a Suazilândia - e fizeram recuar a idade desses objectos em pelo menos... 24 mil anos. "A datação e a análise do material arqueológico descoberto na gruta de Border permitiu-nos demonstrar que muitos elementos da cultura material que caracterizam o estilo de vida dos caçadores-recolectores San faziam parte da cultura e da tecnologia dos habitantes do local há 44 mil anos", diz em comunicado Lucinda Backwell, co-autora, da universidade sul-africana de Witwatersrand.
Isto significa que a emergência da modernidade em África (que se verificou no período designado por "Idade da Pedra Tardia") terá coincidido com o Paleolítico Superior na Europa, altura em que o Homo sapiens chegou ao continente europeu. "O nosso trabalho prova que, na África do Sul, a Idade da Pedra Tardia começou muito mais cedo do que imaginávamos e ocorreu mais ou menos em simultâneo com a chegada dos humanos modernos à Europa", diz Paola Villa, outra co-autora, da Universidade do Colorado, EUA.
As novas datações, salientam os cientistas, mostram para além da dúvida que, há uns 44 mil anos, as pessoas que viviam na gruta utilizavam tecnologias tradicionalmente conhecidas como sendo da cultura San. "Enfeitavam-se com cascas de ovos de avestruz e conchas de animais marinhos, gravavam anotações nos ossos", diz Lucinda Backwell. "Fabricavam finas pontas com osso, que utilizavam como furadores ou para fazer setas. Uma dessas pontas tem uma espiral gravada que está cheia de ocre vermelho, muito semelhante às marcas que os San fazem para identificar as setas quando caçam."
Num pau de madeira decorado, os cientistas descobriram aliás resíduos de ricina, um potente veneno - e o mais antigo indício da utilização de veneno até agora descoberto. E também uma bola de cera de abelha, misturada com resina de eufórbia (uma planta tóxica) e talvez com ovo, embrulhada em fibras vegetais. "Este composto complexo, utilizado para fixar as pontas das setas ou as ferramentas a uma haste, foi directamente datado e tem 44 mil anos", diz ainda Lucinda Backwell. "É o vestígio mais antigo de sempre da utilização de cera de abelha."
Os autores pensam que terá sido o povo San a desenvolver e espalhar a cultura humana moderna pelo mundo. Mas, ao mesmo tempo, como frisa Paola Villa, "as diferenças tecnológicas e culturais entre a África do Sul e a Europa mostram que os povos dessas duas áreas escolheram caminhos radicalmente diferentes de evolução técnica e social". E concluem que, de facto, ainda não existem dados suficientes para determinar as trajectórias, eventualmente múltiplas, da expansão mundial da modernidade humana.

terça-feira, julho 24, 2012

Quem Perde e Quem Ganha Com a Queda Dos al-Assad?

RÚSSIA : O fim do regime de Damasco fará Moscovo perder o seu aliado no Médio Oriente. Em nome de uma relação que vem dos tempos soviéticos, a Rússia usa o veto na ONU para travar medidas contra Bachar al-Assad. Ameaçada está a utilização da base de Tartus pela frota russa.

ESTADOS UNIDOS: Com o apoio aos rebeldes, os americanos estão prestes a conseguir algo que falharam durante a Guerra Fria: fazer a Síria passar para o seu campo no Médio Oriente, como aconteceu com o Egito na década de 1970. Mas há no terreno agentes da CIA a evitar que o armamento para o Exército Sírio Livre chegue às mãos da Al-Qaeda, que também dá combatentes (e bombistas) à rebelião. Washington quer ter certeza que novo regime será amigo.

IRÃO: Se há país árabe com o qual os ayatollahs sempre contaram é a Síria, até durante a guerra de 1980-1988 com o Iraque. O fim de Assad deixará os iranianos sem contacto com os seus aliados libaneses do Hezbollah.

ARÁBIA SAUDITA: Têm sido o Qatar e os sauditas a darem os meios financeiros para a rebelião. Para compra de armamento e para incentivar a deserções de generais sírios. O fim da dinastia Al Assad (Bachar herdou o poder do pai Hafez em 2000) terá como recompensa para a Arábia Saudita uma nova vitória sobre o Irão na luta de influência regional. Já ao apoiar a repressão no Bahrein sobre a maioria xiita os sauditas tinham triunfado.

TURQUIA: Como retaliação ao derrube de um caça pelos sírios, Ancara facilita a passagem de armas na fronteira. De repente os rebeldes exibem armas antitanques e atacam Damasco. A Turquia sacrificou um parceiro económico, mas reconquista no mundo árabe a influência que desaparecera com o fim do Império Otomano.

ISRAEL: Com os Al Assad Israel sabia com o que contar: apoio de Damasco aos palestinianos do Hamas e congelamento das hostilidades nos Montes Golã, ocupados na Guerra dos Seis Dias (1967). Apesar de o Presidente Shimon Peres desejar a vitória dos inimigos de Assad, sujo de sangue, os israelitas temem que a derrocada do regime possa ser marcada por transferência de armas para o Hezbollah e, numa segunda fase, pela proliferação de extremistas islâmicos nos Golã, como acontece já no Sinai (Egipto).

ONU: Impasse sobre a Síria no Conselho de Segurança, com o veto russo (e chinês), reforça a ideia que as Nações Unidas são um clube com quase 200 membros mas onde as grandes potências são quem mais ordena.

CRISTÃOS SÍRIOS: As minorias apoiaram sempre os Assad, eles próprios alaouitas (seita xiita). Com o fim da ditadura, os cristãos sírios ficarão tão vulneráveis aos fanáticos como os do Iraque após a queda de Saddam.
Fonte : DN

quarta-feira, julho 18, 2012

Maior barragem dos maias descoberta na cidade de Tikal


No meio de uma floresta tropical da Guatemala parece pouco provável que a água tenha sido um problema para o crescimento de uma civilização. Mas foi - e a engenharia é que permitiu à cidade de Tikal, uma das mais importantes da civilização maia, abastecer as suas casas, os seus palácios e templos ao longo de 1500 anos, utilizando um sistema de recolha e transporte de água complexo. A última prova desses feitos de engenharia está na descoberta da maior barragem construída pelos maias, revelada na última edição da revista norte-americana Proceedings of the National Academy of Sciences. Era a Barragem do Palácio.
As ruínas de Tikal podem ser visitadas, revelando a imponência da antiga cidade-Estado dos maias, que misteriosamente entrou em declínio no final do século IX d.C. Mas quem não soubesse dificilmente encontraria hoje as ruínas da cidade perdida no meio da floresta luxuriante, no Norte da Guatemala, com alguns templos em forma da pirâmide a ultrapassarem a altura da vegetação.
Antes dos problemas sociais ou de anos seguidos de seca terem esgotado a resistência desta e de outras cidades maias - duas das possíveis causas do declínio desta civilização, que séculos mais tarde ainda teve de enfrentar a chegada dos espanhóis -, estima-se que 120.000 pessoas tenham chegado a viver na região central de Tikal, num círculo com um raio de 12 quilómetros.
Como é que esta cidade se abastecia de água potável? O antropólogo Vernon Scarborough e colegas, da Universidade de Cincinnati, nos Estados Unidos, e da Universidade de San Carlos da Guatemala, entre outros, procuraram uma resposta. Tikal fica no meio da floresta de Petén, na Península do Iucatão, numa zona de grutas, onde a água se infiltra facilmente e desaparece terra adentro. Os maias tiveram de se adaptar a essa situação e construíram um sistema de recolha e transporte de água.
"O sistema de água de Tikal foi um dos maiores, mas não sabemos se foi o maior [da civilização maia]. Funcionava por gravidade e tinha uma série de reservatórios, tanques de assoreamento, sistemas de filtragem, barragens e pequenos canais", explica ao PÚBLICO Vernon Scarborough.
O sistema dependia completamente das chuvas. Perto do centro da cidade, o depósito de água mais alto que a equipa estudou, o Reservatório do Templo, ficava a quase 250 metros de altura. Tinha capacidade para 27.140 metros cúbicos, o equivalente a um cubo com 30 metros de lado.
"As grandes superfícies pavimentadas do centro ficavam no topo de um monte. Pátios rebocados, praças, campos onde se jogava à bola, pirâmides, todas estas construções foram concebidas para a água escorrer para antigos poços de pedreiras, que foram convertidos em reservatórios", descreve o antropólogo. "Deste modo, a água era contida nestes tanques, situados em altitude, e depois era libertada na encosta, para abastecer os residentes durante as temporadas de seca."
A ocupação de Tikal ter-se-á iniciado por volta de 600 a.C. e manteve-se durante mais de um milénio, com um período de crise pelo meio, também devido à falta de água, no século III d.C., quando a civilização maia passou do chamado período pré-clássico para o clássico.
Aquela região, refere o artigo científico, poderá ter atraído os primeiros habitantes da cidade devido às nascentes de água nas regiões de maior altitude. Depois, a urbanização terá alterado a paisagem.
Entre os seis reservatórios estudados, um deles, o do Palácio, é o segundo mais alto de Tikal, a quase 240 metros de altitude. E foi ao escavar esta zona que os cientistas encontraram aí aquela que é a maior barragem maia conhecida até agora. Os maias aproveitaram uma escarpa para construir a Barragem do Palácio, com pedras, cal e terra. Atingia dez metros de altura e armazenaria 14.000 metros cúbicos de água.
A equipa quis perceber como era utilizado cada um dos reservatórios durante a ocupação maia, analisando para tal os sedimentos depositados ao longo dos tempos. "O sistema de reservatórios e de desvios de água ficou concluído no fim do período pré-clássico, quando se iniciou uma época mais seca. Provavelmente, esta adaptação ajudou Tikal e outros centros urbanos a sobreviver, enquanto muitos outros foram abandonados", explicam os cientistas no artigo.
O trabalho também permitiu descobrir que o sistema tinha vários tanques de filtragem - com areia -, para limpar a água, embora os investigadores pensem que seria depois fervida pela população.
Apesar de todo este sistema de abastecimento estar muito longe da tecnologia actual, Scarborough defende que é importante olharmos para estas construções maias para reflectir sobre a forma como esta civilização resolveu um problema essencial: a necessidade de ter água potável. "As regiões tropicais podem ser especialmente complicadas devido ao grande número de doenças infecciosas que aparecem quando a água não é filtrada. No entanto, os antigos maias desenvolveram um sistema inteligente de recolha e transporte de água. Logo desde o início da ocupação, estavam preocupados em recolher e ter água potável."

segunda-feira, julho 16, 2012

Criminoso nazi mais procurado foi localizado na Hungria

O criminoso nazi mais procurado, Laszlo Csataryl, foi localizado, esta semana, em Budapeste, mas o «caçador de nazis» Serge Klarsfeld duvida que o governo húngaro processe o detido, acusado de cumplicidade na morte de mais de 15 mil judeus.
«Não tenho a certeza de que haja uma ação legal por parte deste governo conservador» do primeiro-ministro Viktor Orban, afirmou o advogado francês e «caçador de nazis».
Laszlo Csatary, julgado à revelia por um tribunal checo em 1948 e condenado à morte, foi localizado na capital húngara, segundo denunciou o Centro Simon Wiesenthal, que identificou Csatary como o seu «suspeito mais procurado». No entanto, Klarsfeld disse, em declarações à AFP, que «nunca ouviu» falar dele.
«Na minha opinião, ele não teve grandes responsabilidades, deve ter sido um comissário», afirmou, considerando que a única razão para Csatary estar no topo da lista é haver muito poucos criminosos de guerra nazis vivos: «Há 30 anos ele seria o número 3500 da lista.»
O Centro Wiesenthal pediu ao Ministério Público húngaro para que Csatary seja levado a julgamento, dado que ele foi oficial de polícia na cidade eslovaca de Kosice, sob controlo húngaro durante a II Guerra Mundial, e por isso terá sido cúmplice da deportação de milhares de judeus de Kosice e dos arredores para o campo de concentração de Auschwitz.
Csatary fugiu para o Canadá, onde trabalhou sob identidade falsa, até que em 1995 caiu o seu disfarce e foi obrigado a fugir novamente. Estará a viver há 17 anos na Hungria, com a sua verdadeira identidade.

quinta-feira, julho 12, 2012

Povoamento da América aconteceu em três vagas sucessivas

Os progressos da genética podem ter permitido enterrar o machado de guerra num debate histórico: o povoamento da América fez-se a partir da Sibéria por populações vindas da Ásia, mas em três vagas sucessivas e não apenas numa, diz uma equipa internacional de investigadores na revista Nature.
Este modelo de povoamento, em três vagas sucessivas, já tinha sido proposto em 1986 por linguistas, mas não foi aceite, na época, pela comunidade científica.
Publicado nesta quarta-feira na revista britânica Nature, um estudo traça a história do património genético das populações nativas americanas, realizado por um consórcio internacional com mais de 60 cientistas. E demonstra que, pelo menos em parte, o modelo de 1986 estava correcto.
Ao analisar o genoma de 500 pessoas oriundas de 52 populações nativas americanas e 17 da Sibéria, com a ajuda de programas informáticos, os investigadores conseguiram obter uma visão de conjunto do seu património genético. A comparação entre mais de 364.000 marcadores genéticos “permitiu estabelecer o grau de diferenciação ou de semelhança genética entre estas populações”, escreve, em comunicado, o Centro Nacional da Investigação Científica (CNRS) de França, que contribuiu para este estudo.
As análises confirmam que a maioria das populações ameríndias resulta de uma vaga de migração vinda da Sibéria há cerca de 15.000 anos, durante uma glaciação que, na época, tornou o estreito de Bering transponível.
Os resultados também salientam a grande diversidade genética entre os indivíduos do Norte da América, enquanto as populações mais homogéneas geneticamente são as da América do Sul.
Mas, acima de tudo, a investigação demonstra a existência de duas outras vagas de povoamento asiático, que ocorreram depois (há entre 15.000 e 5000 anos), o que confirma o modelo proposto em 1986 por Joseph Greenberg, Christy Turner e Stephen Zegura, salienta o CNRS. Estas duas vagas posteriores “ficaram acantonadas no Alasca, Canadá e no Norte dos Estados Unidos”.
E, contrariamente ao que afirmava o modelo de 1986, os novos povoadores integraram-se bem nas populações que já existiam naquelas regiões, formando os povos esquimós, por exemplo.
Qualquer que seja o período em questão, a genética mostra que as populações colonizaram o continente americano em direcção ao sul, seguindo as zonas costeiras e separando-se ao longo da sua dispersão. Depois desta separação, as trocas genéticas entre os diferentes grupos foram muito reduzidas, em especial na América do Sul.

sábado, julho 07, 2012

Gabriel Garcia Marquez perdeu a memória e não voltará a escrever

O escritor colombiano Gabriel Garcia Marquez não vai voltar a escrever, depois de ter sido diagnosticado com demência. O anúncio foi feito pelo irmão do escritor, Jaime Garcia Marquez, numa conferência em Cartagena das Índias, Colômbia. Visivelmente emocionado contou que o Nobel da Literatura está bem em termos físicos, mas que perdeu a memória.

Nos últimos tempos, muito se tem especulado sobre o estado de saúde do escritor, que tem 85 anos. Em Junho, um amigo tinha contado à imprensa que Gabriel se andava a esquecer de muitas coisas e até já nem conhecia os amigos e familiares.
Agora, o irmão mais novo falou sobre a situação pela primeira vez e confirmou o estado de saúde do escritor, para que acabem os rumores. “O facto é que se têm feito muitos comentários. Alguns são verdadeiros mas vêm sempre acompanhados de detalhes mórbidos. Às vezes parece que preferiam que ele estivesse morto, como se a morte fosse uma grande notícia”, disse Jaime, citado pelo El Mundo, criticando as notícias que têm vindo a público. “Ele tem problemas de memória”, acrescentou, sem esconder a tristeza. “As vezes choro porque sinto que o estou a perder.”
Jaime explicou que existem casos de demência na família, mas que com Gabriel a situação se complicou depois dos tratamentos ao cancro em 1999. “A quimioterapia salvou-lhe a vida mas também acabou com muitos dos neurónios, das defesas e células e acelerou o processo”, atestou.
Ainda assim, o autor de “Cem Anos de Solidão” continua a “conservar o humor, a alegria e o entusiasmo”, garantiu Jaime, explicando que Gabriel teve de parar de escrever, não devendo sequer voltar a fazê-lo mais. “Infelizmente acho que não vai ser possível, mas oxalá esteja equivocado”, notou Jaime, lamentando que o irmão não possa escrever a segunda parte do seu livro de memórias, “Vivir para contarla”.
O escritor colombiano, que vive no México desde a década de 1980, publicou o último livro, “Yo No Vengo a Decir Un Discurso”, em 2010, depois de uma pausa de seis anos, uma vez que já não publicava nenhuma obra desde 2004, quando lançou “Memória das minhas putas tristes”. “Cem Anos de Solidão”, escrita pelo colombiano em 1967, é uma das obras mais lidas e traduzidas – cerca de 30 idiomas – em todo o mundo.

"A História é uma relação com o público"


Porque é que precisávamos de uma nova "História de Portugal"?
Este livro foi uma encomenda da Esfera dos Livros, que me pediu que formasse uma equipa para escrever uma síntese da História de Portugal num só volume. Aceitei por duas razões. A primeira tem que ver com o facto de a História ter mudado muito nos últimos 20 ou 30 anos. Há muito mais gente a fazer História, e a fazê-la de outra maneira, com outros contactos, nomeadamente internacionais, o que deu uma natureza diferente ao trabalho, muito mais académico. Mas também se tinha transformado num sentido negativo, tinha-se tornado muito monográfica, muito especializada, fazendo com que a maior parte das produções se tivesse tornado inacessível ao público. Ora, a História é a relação com o público. E era preciso voltar a estabelecer essa relação com o público.
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Concretamente, em que é que esta "História" é diferente das outras?
É diferente a começar por aí. Não havia um equivalente a ela. A mais aproximada a este modelo é a "História" de Oliveira Marques, que foi concebida em 1972, e aquela outra mais pequenina, "A História Concisa de Portugal" de José Hermano Saraiva, que data de 1978. O que havia eram atas de congressos, artigos fora do alcance do comum das pessoas e depois aquelas "Histórias" em vários volumes publicadas a partir da década de 80 e durante os anos 90, dirigidas por José Mattoso, João Medina, e também a "Nova História de Portugal" dirigida por Oliveira Marques e Joel Serrão. Portanto, era tudo estantes. Aquilo de que precisávamos neste momento era de um só volume, para um público culto poder ter um contacto com a História mais manuseável e ao mesmo fazer face à necessidade de síntese que nós, historiadores, sentimos para perceber qual é a nossa visão.
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Nas investigações que fizeram, alguma vez se depararam com o facto de o passado se tornar imprevisível?
Como trabalho de síntese, a feitura desta "História" não assentava em investigação original. Mas essa síntese, baseada na maior parte da produção historiográfica das últimas décadas, traz surpresas, sobretudo de ênfases, de opções. Creio que haverá para o leitor algumas surpresas, sobretudo para o que não acompanha a produção universitária, mas também para os autores, pois com o nosso trabalho de composição fomos obrigados a olhar de uma maneira diferente para determinados momentos, figuras e acontecimentos.
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É um trabalho mais interpretativo? Sim. Tinha de ser uma síntese interpretativa, não íamos limitar-nos a, através de tesoura e cola, colecionar uma espécie de antologia daquilo que os outros escreveram. Tanto eu como o Bernardo Vasconcelos e o Nuno Monteiro tivemos sempre a noção de que isto é uma História de Portugal, nós próprios podíamos ter escrito outra, completamente diferente. Temos consciência de que isto é uma solução para contar a História de Portugal. Há outras.


Jornal Expresso, 7-7-2012

quinta-feira, julho 05, 2012

Vasos de cerâmica com 20 mil anos são os mais antigos do mundo

Os caçadores-recolectores que há 20 mil anos se refugiaram na gruta de Xianrendong, província de Jiangxi, na China, já armazenavam e cozinhavam alimentos em vasos de cerâmica. Esta descoberta, baseada na descoberta de fragmentos de cerâmica, faz recuar em dois mil anos a invenção da cerâmica.
Até agora, os pedaços de cerâmica mais antigos que se conheciam tinham 18 mil anos e tinham sido encontrados na China, no Japão e Rússia. Mesmo assim, essa é uma descoberta recente – de 2009 –, pois até aí pensava-se que a cerâmica tinha surgido apenas na altura do advento da agricultura, há aproximadamente dez mil anos.
Dez mil anos antes de nos termos tornado agricultores e sedentários, a invenção da cerâmica pode ter tido um papel central na demografia humana e nas adaptações sociais às mudanças climáticas no Leste da Ásia. Nessa altura, a Terra vivia o último pico da idade do gelo, momento em que houve um decréscimo da disponibilidade de recursos alimentares.
A equipa de Ofer Bar-Yosef, da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, publicou a sua descoberta na última edição da revista Science, verificou que muitos dos fragmentos continham também marcas de exposição ao fogo, sugerindo que a cerâmica era usada para cozinhar e armazenar alimentos.
Foi também possível identificar duas técnicas usadas para moldar os vasos de cerâmica: o barro era achatado como uma folha e depois era dobrado e enrolado com uma pá.
Na gruta, havia muitos ossos de veado, o que sugere que a cerâmica pode ter sido usada na extracção de medula óssea e de gordura daqueles animais. “Outros usos conhecidos da cerâmica na sociedades de caçadores-recolectores incluem a preparação e armazenamento de comida, bem como o fabrico de bebidas alcoólicas, e podem ter desempenhado um papel vital nos festejos”, diz a equipa no artigo. Por isso, concluem os cientistas, a invenção da cerâmica mais cedo do que se suponha pode ter acabado por conduzir ao sedentarismo e ao aparecimento do cultivo do arroz no Leste asiático.

quarta-feira, julho 04, 2012

Nova expedição para encontrar vestígios de Amelia Earhart

Uma nova expedição partiu, esta terça-feira, do Havai, para tentar comprovar a teoria que a pioneira da aviação Amelia Earhart sobreviveu ao acidente que sofreu há 75 anos, permanecendo numa ilha deserta.
O desaparecimento da aviadora norte-americana, Amelia Earhart, de 39 anos, a 2 de julho de 1937, ficou sem explicação e, 75 anos depois, uma nova expedição partiu de Honolulu, no Hawai, à procura de vestígios do avião de Amelia.
O destino é Nikumaroro, ilha do arquipélago de Kiribati no centro do Oceano Pacífico, onde os cientistas acreditam que o avião se despenhou. A expedição vai durar no mínimo 10 dias, conta com 20 cientistas de todo o mundo, mas é liderada pelo Grupo Internacional para a Recuperação de Aviões Históricos (TIGHAR).
A expedição vai utilizar tecnologia de ponta para mapear o fundo do oceano, como um dispositivo de controle remoto semelhante ao que conseguiu encontrar as caixas negras do avião da Air France que caiu no Atlântico enquanto voava do Rio de Janeiro para Paris em 2009.
Para o TIGHAR, Amelia Earhart e o navegador que a acompanhava, Fred Noonan, sobreviveram ao acidente e estiveram por tempo indeterminado em Nikumaroro que, na época, era uma ilha deserta, uma teoria que continua por comprovar.
Amelia Earhart é uma das mulheres mais importantes na história da aviação e, em 1937, tentava bater mais um recorde. Depois de se ter tornado a primeira mulher a cruzar o Oceno Atlântico, a aviadora tentava concluir a sua viagem de volta ao mundo pela linha do Equador, a forma mais longa de o fazer.

Códice Calixtino roubado da Catebral de Santiago de Compostela encontrado no lixo

A polícia espanhola recuperou o Códice Calixtino, após ter sido anunciada a detenção do ladrão do manuscrito do século XII e dos seus cúmplices. Esta «jóia literária» foi encontrada dentro de um saco do lixo, na garagem do suspeito.
O Códice Calixtino foi recuperado após a confissão de um filho do principal suspeito do roubo e, de acordo com o El Mundo, foi encontrado numa caixa de cartão, dentro de um dos muitos sacos de lixo acumulados na garagem do suposto autor do roubo.
Para alívio das autoridades, o manuscrito foi encontrado em bom estado, juntamente com outros livros da Catedral de Santiago de Compostela - onde o Códice Calixtino estava guardado numa caixa forte no arquivo, até ser roubado a 5 de julho de 2011 - e uma bandeja de prata.

Yasser Arafat pode ter sido envenenado


Yasser Arafat poderá ter morrido envenenado por polónio, uma substância radioactiva, segundo as conclusões de um laboratório na Suíça divulgadas esta quarta-feira pela estação de televisão Al-Jazira.
As análises foram feitas a vestígios biológicos retirados das roupas do líder palestiniano que tinham sido entregues à sua viúva, Souha, pelo hospital militar de Percy, no Sul de Paris, onde Arafat morreu.
Estas explicações foram dadas pelo director do Instituto para a Física das Radiações de Lausane, François Bochud. "A conclusão foi termos encontrado [um nível] significativo de polónio nas roupas", disse Bochud especificando que as análises demoraram nove meses a ser feitas.
O polónio é a substância com que foi envenenado o antigo espião russo Alexandre Livtenko, que morreu em Londres em 2006.
Yasser Arafat adoeceu entre Agosto e Outubro em Ramallah, cidade cercada pelo exército israelita na Cisjordânia, e morreu em Paris em 2004. A sua morte motivou uma série de teorias pois os muitos médicos que o assistiram não conseguiram dar uma explicação para a deteriorização tão rápida do seu estado de saúde. Os palestinianos acuraram sempre Israel de ter envenenado o seu líder histórico; a imprensa mundial noticiou antes da sua morte que sofria de cancro no estômago.
Para que a morte por envenenamento com polónio seja confirmada seria necessário exumar o corpo de Arafat, disse Bochud na informação que enviou a Souha Arafat. "Se ela quiser saber o que realmente aconteceu ao marido, terá que... exumar Arafat permitiria recolhermos uma amostra para vermos se há uma grande concentração de polónio e se houve envenenamento".

Encontrado um exemplar do primeiro mapa-mundo que inclui a América

Dois investigadores alemães encontraram na Biblioteca da Universidade de Munique um exemplar, até agora desconhecido, do mapa-mundo de Waldseemüller, o alemão que foi o primeiro a desenhar o mundo com o continente americano e a palavra América. O mapa agora encontrado será o primeiro exemplar a incluir os cinco continentes.

O documento, com cerca de 500 anos, estava encadernado por engano num outro livro há muitos anos guardado nos fundos da biblioteca, contendo documentos do século XIX e, por isso, até agora tinha passado despercebido.
Para o director da Biblioteca, Klaus-Rainer Brintzinger, esta é “uma descoberta incrível”, uma vez que se conhecem muito poucos exemplares dos mapas desenhados pelo cartógrafo Martin Waldseemüller (1470-1522).
Em comunicado, publicado no site da biblioteca, Brintzinger explicou que este exemplar é mais pequeno que o conhecido mapa mundial de Waldseemüller, que tem três metros quadrados.
“Não havia uma descoberta destas dimensões na Alemanha desde a Segunda Guerra Mundial”, escreveu no mesmo comunicado Sven Kuttner, responsável pelo departamento de livros antigos da Biblioteca Universitária de Munique, destacando o valor histórico do documento.
Martin Waldseemüller é considerado o padrinho da América por ter sido o primeiro cartógrafo a dar esse nome ao novo continente, acreditando que este tinha sido descoberto pelo italiano Américo Vespucio e não por Cristóvão Colombo.
Até agora só se conheciam quatro exemplares da versão do mapa agora encontrado, tendo inclusive uma delas sido leiloada em 2005 pela Christie’s por mais de 800 mil euros.

segunda-feira, julho 02, 2012

O que se está a passar em Tombuctu “é uma loucura”

 
A situação em Tombuctu é grave e não tem, para já, uma solução à vista. Quem o diz é o maliano Lassana Cissé, do comité científico do ICOMOS (Conselho Internacional dos Monumentos e dos Sítios) e responsável pelo património mundial no Mali, que teme pela destruição total do património, depois de esta segunda-feira a mesquita Sidi Yahia ter sido atacada pelos combatentes islamistas.
“A situação é muito grave porque os islamistas já destruíram seis mausoléus dos 16 que estão inscritos na lista do Património Mundial da UNESCO”, disse ao PÚBLICO, por email, Lassana Cissé, que está no Mali a acompanhar de perto a situação, lamentando a actual falta de resposta.
A cidade de Tombuctu, que é considerada a jóia africana, foi tomada pelo Ansar Dine, um grupo com ligações à Al-Qaeda e que quer impor no Mali a sharia (lei islâmica), que não aceita que a população local, sufista, venere mausoléus de santos. O grupo islamista prometeu destruir todos os mausoléus e locais de culto e segundo Cissé a ameaça é para levar a sério.
Já em Abril, o responsável pelo património tinha alertado para a situação. “Num momento de guerra, a destruição do património edificado e do enorme tesouro que são os manuscritos é muito possível”, disse então Lassana Cissé ao PÚBLICO e voltou esta segunda-feira a reafirmar, explicando que o que está a acontecer em Tombuctu, cidade Património Mundial desde 1988, “é uma loucura”.
“Eles [combatentes islamistas] arrombaram a porta de entrada de uma das mesquitas classificadas (a de Sidi Yahia) e prometem destruir todos os lugares considerados sagrados, incluindo os cemitérios e os locais com símbolos artísticos”, contou Lassana Cissé, explicando que os islamistas “querem destruir todo o património significativo ligado a um Santo ou uma tradição ancestral (crença em fenómenos sobrenaturais e lendas)”. “A única razão é o extremismo religioso, o fanatismo e o obscurantismo cultural.”
Lassana Cissé lamenta ainda a falta de apoio à população, “abandonada a si mesma”, que nada pode fazer a não ser “assistir impotente à destruição do património que é legado dos seus antepassados desde o século X”.
Situada às portas do deserto do Sara, Tombuctu fica a mil quilómetros da capital, e tem 30 mil habitantes. É património da humanidade desde 1988 e deve a sua fundação aos tuaregues. Graças à prosperidade que atingiu, sobretudo nos séculos XV e XVI devido ao comércio das grandes caravanas, transformou-se no centro cultural e espiritual de África, pólo a partir do qual o islão se alargou a grande parte do continente.

Fortificações de Elvas são Património Mundial

A maior fortificação abaluartada do mundo, em Elvas, foi hoje classificada como Património Mundial, pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO), revelou à Agência Lusa fonte do município.
As fortificações de Elvas foram classificadas, na categoria de bens culturais, ao início da tarde de hoje na 36.ª sessão do Comité do Património Mundial, que está reunido até 6 de julho, em São Petersburgo, na Rússia.
O conjunto de fortificações de Elvas, cuja fundação remonta ao reinado de D. Sancho II, é o maior do mundo na tipologia de fortificações abaluartadas terrestres, possuindo um perímetro de oito a dez quilómetros e uma área de 300 hectares.

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Único monumento português

As fortificações de Elvas constituíam o único monumento português entre os 33 candidatos que fazem parte da lista de Património Mundial, elaborada pela Unesco.
A fonte do município explicou à Lusa que foram classificadas todas as fortificações da cidade, os dois fortes, o de Santa Luzia, do século XVII, e o da Graça, do século XVIII, três fortins do século XIX, as três muralhas medievais e a mudalha do século XVII, além do Aqueduto da Amoreira.
Classificado como Património Nacional em 1910, o Forte da Graça, monumento militar do século XVIII situado a dois quilómetros a norte da cidade de Elvas, constitui um dos símbolos máximos das fortalezas abaluartadas em zonas fronteiriças.
O Conselho Internacional dos Monumentos e Sítios (ICOMOS) já tinha dado parecer "decisivo e favorável", tendo sido provado que as fortificações da cidade alentejana "reúnem o valor universal excecional, que é o principal para que uma candidatura seja aprovada", segundo a vereadora da Cultura do município de Elvas, Elsa Grilo